sexta-feira, 22 de março de 2024

SONHOS E UTOPIAS

 

Pra. Maria Luísa Duarte Simões Credidio

 

                                                  mensagem de 22/3

 

     Primeiro quero esclarecer um ponto: uma ovelhinha me procurou e perguntou porque, às vezes, minhas ministrações não trazem mais versículos iniciais. Respondi à ela que não preciso de um versículo inicial para falar da Bíblia. Apesar de ser composta por vários livros, a Bíblia é um livro só, que afirma uma única coisa. Depois, como diz um grande teólogo e amigo meu, a Bíblia lida em fragmentos  nos leva a coisas inesperadas e  deduções erradas. Ela é um livro que (faço questão de frisar) NÃO FOI ESCRITO POR DEUS,  mas sim por homens inspirados por Deus. Será que eles entenderam ipsis litteris aquilo que o Senhor queria dizer? E depois souberam passar fielmente isso para o papel? E a tradução? Será que foi fiel? Reflita sobre isso. E toda vez que um versículo ou um texto bíblico lhe trouxer dúvida, apegue-se aos 10 Mandamentos, esses sim, escritos por Deus!

     Escrever sobre o conteúdo da Bíblia, que acredito ter sido inspirada por Deus, não me obriga, de forma alguma, a citar versículos esparsos. Posso a fazê-lo. Mas não tenho obrigação nenhuma de agir dessa maneira.

     Hoje vamos falar de utopias. Daqueles sonhos que todos nós acalentamos e nutrimos em nossa mocidade e que morreram com o passar do tempo.

      Hoje muito se usa a expressão " já não se fazem jovens como antigamente". O que isso quer dizer? Que a juventude atual é alienada e omissa, uma vez que se recusa ao engajamento político. Nós  e aqueles da nossa geração, nos engajamos, lutamos, brigamos pela liberdade de imprensa, pela "paz e amor", pelas "diretas já", curtimos  Imagine dos Beatles como filosofia de vida, depos degringolamos para o Let it be, vimos jovens pintar seus rostos, defenderem impeachment e por aí afora.

      Stephen Kanitz diz sobre sua geração:

"A reunião de trinta anos com meus colegas da USP foi ainda mais surpreeendente. O mais engajado da época, o que mais pregava luta de classes, é hoje diretor de banco. Seu colega socialista, menos radical, é hoje o dono do banco. A maioria se desculpou dizendo: "Cansei de ajudar os outros" (sic), " estou ficando velho e preciso me preocupar comigo mesmo". Passaram a vida tramando uma revolução, perderam a chance de ajudar milhares de carentes com sua competência, inteligência e trabalho". A íntegra dessa entrevista do Kannitz sobre os 30 anos dos formandos da FEA-USP pode ser encontrada em  http://veja.abril.com.br/120901/ponto_de vista.html

        Stephen Kannitz admira a nova geração não engajada. Sabe porque? Porque cansada do discurso utópico do engajamento inativo, optou por mudar a vizinhança enquanto caminha na direção de mudar o Brasil. Em vez de ficar lutando por uma bandeira qualquer, eles se engajaram no terceiro setor, dando sua contribuição através de ONGs que fazem o que o governo não mais consegue fazer sozinho. Uma nova geração (há picaretas, como em todas as áreas e lugares, quero ressaltar) que busca melhores condições acadêmicas e profissionais e, ao mesmo tempo envolve-se em trabalho voluntário, sem alarde.

        Faz muito tempo (entrei na minha 1ª faculdade com 16 anos, em 1971- completava 17 no meio do ano-) que me desencantei dos chavões de "vamos mudar o mundo", "vamos fazer uma revolução". Aliás,  apesar de ter tido simpatia por eles, nunca consegui me engajar nos grupos que os defendiam porque meu pai era dono de uma grande construtora  e eu era colocada de escanteio, pois representava o empresariado opressor, a classe dominante.

       Desencantei-me desses discursos. Perdi a  utopia?, você vai me perguntar. Não! Só mudei de utopia! Creio cegamente que aos 17 anos a gente tem que ser revolucionário. Mas aos quarenta, meu irmão, está na hora de mudarmos o mundo com trabalho e competência . E aos cinquenta, com  ação  e exemplos !

         Vemos muito, principalmente nas Igrejas, gente querendo erradicar a fome da Namíbia sem ser solidária com o pobre que está sentado a seu lado, Vemos gente querendo tirar crianças da rua, sem enxergar o sobrinho que morre de vontade de estudar e não tem dinheiro para pagar o curso. Enfim, queremos fazer um "auê" pela alfabetização do país, sem sermos voluntários no programa de alfabetização que a empresa onde trabalhamos promove. Vemos quem prega a Palavra - e não trabalha -, dizendo que o marido exige que na 4ª quinta-feira do mês fique em casa para descansar, como se não houvessem aqueles que  não precisassem ouvir a Palavra na 4ª quinta-feira do mês ! E por aí afora...

     O Novo Testamento traz uma utopia. Mas não é a utopia de um mundo todo iluminado. Não! É a utopia das cidades edificadas sobre os montes, onde vivem os bem aventurados. Nessas cidades há multiplicação dos sinais de justiça, que o mundo não consegue deixar de reconhecer. Aí todos olham as cidades iluminadas, olham as pessoas que moram nelas praticando boas obras e glorificam ao Pai que está nos céus.

     A utopia de vencer a injustiça não exige muito. Exige que enxerguemos que os injustiçados estão bem perto de nós, às vezes ao nosso lado. E a partir daí, trabalhar por eles e repartir com eles. Eu já contei que tinha uma tio general, que comandava  o 2º Exército e o extinto SNI e que  insistia em dizer: "Ninguém muda o mundo, sem mudar o que está á sua volta. Uma revolução começa dentro do seu lar".

     Portanto, meu irmão, quem ama de verdade, ama seu próximo seja ele quem for. Quem se preocupa com os que estão longe demonstra , como diria Salomão em Eclesiastes, no superlativo, " vaidade de vaidades", palavra traduzida por Haroldo de Campos( in Quando tudo não é o bastante, São Paulo, Nobel, 1999. pg.22) como  névoa de nada, inutilidade, futilidade, ausência de sentido. Que  não levam a coisa alguma. É por aí que você quer seguir? Pense nisso. 

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