sexta-feira, 4 de abril de 2014

CONFISSÕES DE UM CORRUPTO

        Conheço um policial recentemente exonerado por corrupção. Outro dia, ao chegar à casa da minha mãe, ele, que é um morador das cercanias, veio conversar comigo, tentado me convencer da "barbaridade" que tinham feito com ele. Fui direta e perguntei: "Você aceitou dinheiro para arquivar inquéritos e proteger bandidos?" E ele, ainda temeroso, me respondeu que sim. Depois começou a me explicar o porquê. Disse que sentia um ódio intenso por todos os criminosos, que andavam em carrões importados, vestiam-se com as melhores marcas e usavam o pescoço como vitrine de joalheria, além da coleção de relógios de ouro que desfilavam. De outro lado, dizia ele, "nós, os policiais, somos atacados pela mídia, que nos faz acusações e mais acusações de corrupção e de violência. Ou seja: a mesma sociedade que defendemos da escória marginal, nos ataca!
        Nossos superiores agarram-se aos políticos, tomam suas causas e enchem o ouvido do povo sobre essa baboseira de direitos humanos. Bandidos cometem crimes e eu não era tratado como um brasileiro livre, que pudesse odiá-los, querer tirá-los ao menos do caminho da minha família! Analiso o curso que minha vida tomou", disse. "Na primeira metade de minha carreira, fui um grande policial, um verdadeiro paladino defensor da sociedade. Tinha um intenso ódio dos criminosos! São baratas que vão acabar com a civilização. Não querem trabalhar, não querem estudar e dedicam-se a assaltar cidadãos desarmados por uma campanha infame do Governo Federal, transformam suas mulheres em prostitutas, além de terem um desrespeito intolerável pela lei e seus agentes.
     E nós, os agentes da lei? Tínhamos o dever de proteger a sociedade contra a maldade desses vermes, que se propagavam pobres, tirando dos ricos para dividir com todos. Como se fossem Robin Hood! Tinham no próprio coração, a vontade de ficarem ricos! Queriam carros, roupas, comidas, bebidas e acima de tudo, as mulheres que os ricos podiam ter..."
     E me segredou:" Tudo começou como um agrado num dia que concordei em receber propina para proteger o jogo ilegal. Depois que recebi uma vez, já estava contaminado pelo vírus da corrupção. Em seguida veio o dinheiro dos traficantes, pela proteção e daí para diante a coisa rolou como uma avalanche. Olhava meus amigos "honestos" e pensava: têm o status de "policial herói", mas nenhuma recompensa monetária...Continuam comprando roupas baratas, sapatos de liquidação e a fazer malabarismos para que o salário dê até o final do mês. Na verdade, eles que protegem os ricos da escória, são tratados como indivíduos abaixo da escória. E segundo a opinião pública, estavam abaixo de um criminoso qualquer.
      Alguns policiais foram processados e até mandados para a cadeia, por fazerem seu trabalho. Outros, foram despedidos, exonerados de seus empregos. Estupradores, vagabundos perigosos, ladrões, assaltantes armados em plena luz do dia, tinham mais direito e respeito que os policiais. E mais poder também! E a jornada dupla, ou seja, no "bico" de segurança que arrumavam para poder manter o pão em casa? Tudo isso torna o policial muito vulnerável, um verdadeiro zumbi que trabalhava dia e noite, initerruptamente.  E aí você vai me dizer: "É uma questão de caráter" ! "Quero ver você manter seu caráter íntegro, quando seu filho tem que fazer uma operação de apendicite e você não tem como pagar!!! Tente...
      Meu sonho, continua o ex-policial, era arrumar um emprego de chefe de segurança num hotel de bacana, atirar meu distintivo e minhas recomendações por bravura na cara do Governo e do público e ganhar um salário dez vezes maior e que não me expusesse a tantos riscos e me desse gordas caixinhas em dólares. Mas acostumei-me com o dinheiro fácil e farto...E uma coisa foi chamando outra e eu me esquecendo que a mesma bandidagem que lhe paga, lhe denuncia, lhe descarta quando acha alguém mais baratinho...E aqui estou eu, com uma marca de corrupto carimbada na testa. Meus filhos, conhecidos como "filhos daquele policial corrupto que mora naquela casa perto da padaria" e assim chamados por seus pares na escola. Digo pares, porque amigos eles não tem mais. São evitados como leprosos, como se fossem contaminar alguém por meu ato de corrupção...A mulher, ah...essa, perdi. Quando o dinheiro minguou e fui exonerado, ela arrumou as coisas, abandonando os três filhos e foi embora para a casa da mãe, em Barretos. Hoje dizem que está amasiada com um delegado.
      Estou contando tudo isso para que você publique em seu Blog e para que muitos saibam que a corrupção é como doença de Chagas: uma vez picado, não há remédio. Apenas a ladeira abaixo. E digo mais: se hoje trabalho de guarda noturno, andando a noite inteira pedalando uma bicicleta, é para sustentar meus filhos. Se dependesse apenas de mim, já teria dado um tiro nos miolos."

       Fiquei estarrecida com a sinceridade desse homem que eu mal conhecia. Fiquei surpresa com sua noção crua da vida. Afinal, que sociedade é essa que dá mais valor ao traficante e ao bicheiro que mantém a escola de samba, que ao policial que garante sua segurança? Que sociedade é essa onde homens da lei não ganham o suficiente para o sustento de seus familiares? Que sociedade é essa que berra na porta das delegacias, defendendo bandidos em nome dos "direitos humanos"? Que sociedade é essa que não quer refazer um Código Penal de 1940? Que não quer rever a maioridade penal, permitindo, sempre, que menores assumam os crimes praticados por seus chefões?
     Estamos num beco sem saída. A única luz que brilha no fim do túnel chama-se URNA. É preciso reformar o Congresso para que mudanças de peso possam ser implantadas. Enquanto isso não acontecer, vamos continuar tendo uma média altíssima de estupros, maior até mesmo que a de assaltos, e vamos, infelizmente, continuar a manter em nosso meio corruptores e corrompidos. Triste fim, para uma menina que ouvia os discursos de Carlos Lacerda e acreditava realmente que era possível um Brasil melhor...

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