sábado, 22 de março de 2014

Bastam alguns heróis

É digno de pena o povo que anseia pelo surgimento de heróis.
Heróis não são pessoas comuns, e surgem em momentos de crise. No imaginário popular, são paladinos da justiça, que descerão montados em belos cavalos, açoitando corruptos, afrontando poderosos e providenciando soluções para todos os males da humanidade.
O ministro Barbosa, do STF, por suas atitudes desatreladas dos centros de poder, pelo eventual destempero verbal e pelo enfrentamento de situações difíceis, no trato com autoridades e mídias, já figurou como candidato à presidência, no partido das multidões. Sua glorificação, por uns, e repúdio, por outros, demonstra que estamos, literalmente, órfãos de heróis com cargos ou abrangência públicas.
Como nossa situação é de penúria e carências elementares, sequer a busca de heróis é sofisticada e muito exigente. Queremos um herói que dê umas palmadas na bunda do menor criminoso que atormenta o bairro e comete seguidos e impunes delitos.
Queremos um herói que tire a cracolândia de nossa porta, e devolvendo-nos o direito de ir, vir e permanecer. Basta até um heroizinho que faça valer a proibição de bebidas a menores, e dificulte a escalada das drogas.
Para multidões desesperançadas, um herói que pagasse precatórios e outro, que distribuísse justiça em menor tempo já seria suficiente. Ruralistas sonham com heróicas providências do iluminado que desse rápida solução à invasão de propriedades, decidida em tribunais de exceção.
Comerciantes aguardam pela vinda, inesperada e aplaudida, do paladino que acabará com o quebra-quebra infiltrado nas manifestações, e pelo ressarcimento, via Estado ou bolso dos marginais, dos prejuízos sofridos. Figuras estratosféricas e angelicais são aguardadas pelos brasileiros que insistem em privacidade e silêncio noturno, impune e seguidamente importunados pelos bailes Funk ao ar livre.
Pacientes sonham com unidades de saúde que atendam e socorros que não faltam. Professores, modestos, só buscam respeito e, se possível, alguma recompensa financeira.
Faltam heróis nas sociedades que não edificaram instituições, pouco cidadãs, historicamente acostumadas às migalhas distribuídas e providências não acauteladas. Faltam heróis em sociedades que condenam homens públicos pelos crimes que elas próprias cometem, no dia-a-dia.
Faltam heróis e faltam bons eleitores, nos ambientes que glorificam políticos menores, que nada edificam e vivem à caça de verbas e favores. São ridículas figuras, sempre sorridentes e solícitas, capazes de apoiar qualquer atentado à democracia e à ética pública, desde que garantidos lugares confortáveis, nas imediações do Poder.
Talvez surja algum herói esquisito e impotente, dizendo-nos que o heroísmo é o somatório das atitudes, condenações e exemplos individuais, tornando salutar e justa a própria sociedade, ainda que persistam, por algum tempo os ridículos da vida pública.
Aguardando heróis, seguimos infelizes e desesperançados.


Malu Simões

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